Por que um raro texto racional da esquerda ajuda a compreender a importância do conhecimento como arma para a guerra cultural para a direita brasileira.
Desde o início de meu aprendizado em política há cerca de três anos – quando logo me identifiquei como conservador – tenho tido a curiosidade de entender o que se passa na cabeça das pessoas que se identificam com a esquerda. Se política é a arte de promover o bem comum, como explicar a defesa de um pensamento político com tantas sucessivas demonstrações de fracasso? Me intrigava como tantas pessoas poderiam ainda continuar centradas de forma tão inabalável nesta linha ideológica.
Tudo que havia encontrado até o momento fora leviandade, estupidez, apego a rótulos prontos e símbolos dissociados de qualquer senso crítico ou estofo intelectual, indolência cognitiva, teorias conspiratórias das mais absurdas ou simples histeria coletiva. Geralmente algo impulsionado pelo efeito manada dos “coletivos”, mas não restrito a esses nichos. Aí se incluem, inclusive, as palavras e textos dos ditos “intelectuais” de esquerda. Marilena Chauí, por exemplo, suscitou a tese de que o juiz Sérgio Moro foi treinado pelo FBI e pela CIA. O jurista Fábio Konder Comparato cogitou a possibilidade um “golpe do golpe”, onde a elite empresarial do país fomentaria uma nova intervenção militar à reprise de 64. Isso quando a mesma elite, formada por Odebrechts, Batistas e consorciados, sempre esteve promiscuamente relacionada com a iluminada cúpula da esquerda nacional, como denotado pela operação Lava Jato.
Todas essas teses absurdamente descoladas da realidade mostravam o baixo nível de intelectualidade da esquerda, seja ele natural ou proposital. Afinal, talvez houvesse a necessidade de elucubrar estes estapafúrdios para retroalimentar a militância socialista. Manter acesa, nestes, a sensação da opressão das “elites” para não deixar arrefecer as farândolas vermelhas. Irrelevante que qualquer mínima dose de racionalidade e conhecimento dos fatos mostre que as elites metacapitalistas têm, aqui e além-mar, fervorosas intenções de fomentar justamente os movimentos de esquerda. O mais importante seria a construção da narrativa, com aproveitamento justamente da baixa capacidade cognitiva dos militantes.
Mas eis que finalmente surge, em meio a esse deserto de discernimento, um texto com um mínimo de base lógica digna de atenção. Rosana Pinheiro-Machado, professora do departamento de Desenvolvimento Internacional da Universidade de Oxford, publicou o texto “A nova direita conservadora não despreza o conhecimento” através da Carta Capital[1]. Dada essa verdadeira raridade, li com interesse o artigo e entendi que seria relevante escrever para apresentar rápidos contrapontos e comentários gerados de reflexão à direita.
Nesse sentido, de forma objetiva, cito abaixo os pontos chave do texto e pinço as imprecisões.
“ A nova direita não é anti-intelectual, mas anti-elite intelectual.”
Correta inicialmente ponderação. A direita nacional tem se mostrado ávida por conhecimento, estimulada por vozes como a do filósofo Olavo de Carvalho e tantos outros que tornaram a compreensão da realidade histórica e política como a principal arma de uma guerra cultural em pleno desenvolvimento. O erro do texto, nesse ponto, é crer que essa elite intelectual possui o monopólio da dicção do que é, de fato, conhecimento. Não é de hoje que se sabe existir uma verdadeira hegemonia da esquerda nas universidades, nas secretarias de educação e em meio a boa parte do professorado nacional. É contra essa elite que se volta a direita, não tanto por dissenso ideológico, mas mais pelos nocivos efeitos que tem gerado para o país.
Nesta questão destacam-se dois fatores, ou subprodutos diretos da elite intelectual esquerdista: manipulação da narrativa histórica (retratando, por exemplo, a revolução cubana como heroica, malgrados os seus mais de cem mil mortos e miséria humana gerada, e a contrarrevolução militar brasileira de 64 e seus míseros trezentos e tantos mortos como sanguinária) e destruição completa do contraditório e do debate democrático de ideias em sala de aula.
Em meio à incessante doutrinação, a esquerda docente sentiu-se confortável não só a eliminar das grades curriculares referências positivas à cristandade, ao capitalismo, às conquistas civilizacionais do mundo ocidental, como também para repelir qualquer insurgência. O projeto “escola sem partido”, que visa justamente restabelecer o contraditório e a democratização da filiação política dos alunos, é classificado como forma de censura e combate ao senso crítico. Utilizam as próprias vicissitudes resultantes da doutrinação esquerdista reinante (que impede qualquer debate e fulmina o senso crítico dos alunos na origem) como condenações ao projeto, exatamente como fizera, de forma absurdamente equivocada, mas em tom professoral, Leandro Karnal no programa Roda Viva.
“O que está em jogo é a produção e a disputa de novos regimes de verdade sobre a humanidade.”
Em realidade, o que pretende a direita é apenas revelar a verdade. Não moldá-la para fins ideológicos – no caso, ao intento revolucionário ou às metas de engenharia social progressistas. Ocultar as quase duzentas milhões de mortes não naturais provocadas pelo comunismo no século XX não é produzir novo regime da verdade. Imputar ao cristianismo parcela de culpa para a escravidão africana, quando todo o alicerce normativo, moral, teológico e doutrinal da cristandade sempre foi duramente contrário à prática, não é produzir um novo regime de verdade. Eliminar qualquer referência aos pais fundadores do país, aos heróis nacionais e os fatores históricos de construção de um senso de nacionalidade e patriotismo não é produzir novo regime de verdade. Em todos os casos, trata-se da mais absoluta deturpação da verdade com propósitos evidentemente manipulatórios. Trata-se de impedir que os alunos saibam de fato a que país pertencem, facilitando assim a “mundialização” das pessoas, que a articulista confessa ser propósito progressista ao longo do texto.
“Deparamo-nos com a necessidade de voltar a defender o óbvio, ou melhor, aquilo que parecia óbvio, aquilo que acreditávamos que já havíamos superado. Mas não superamos.”
Chersterton já dizia: “chegará o dia em que teremos que provar ao mundo que a grama é verde”. A frase, hoje claramente profética e comprobatória da visão de longo alcance deste ícone do conservadorismo inglês, faz sentido cabal diante da absoluta inversão de valores que o pensamento hegemônico de esquerda tem produzido em todo o mundo ocidental. Logo, conquanto parece fazer coro com a articulista, a sentença de Chesterton possui similaridade apenas formal. No conteúdo, trata-se de obviedades diametralmente opostas.
A esquerda, pela manipulação da narrativa histórica, tentou cristalizar suas mentiras e deturpações (pela mesma razão, aliás, que antipatiza o projeto escola sem partido), gerando em certos segmentos da sociedade a negação de verdades inquestionáveis (como a de que um feto, após a concepção, é um ser vivo em formação, não componente do corpo da gestante, ou que meninos e meninas nascem com um sexo biologicamente definido). O grau de hegemonia foi tanto que, como visto, estimaram que a desfiguração da realidade por si produzida seria irreversível. Não o é, pois a verdade, como ela é, sempre tende a vir à tona, mais cedo ou mais tarde. Exemplo disso é o recente estudo da Universidade de Harvard, apontando que a liberação e massificação do porte de arma é fator determinante, sim, para a redução dos índices de criminalidade e violência[2]. Talvez por isso interesse à esquerda manter os estudantes brasileiros no status atual, limitando-os à obtenção das piores notas nos testes internacionais[3]. É preciso que as massas se mantenham pobres intelectualmente para mais fácil manipulação e ocultação da verdade.
“Se há algo positivo nisso tudo é não nos deixar esquecer conhecimento é poder, mas também é resistência: precisamos conhecer o outro lado e, principalmente, lembrar que o senso de humanidade una, justiça, direitos humanos e equidade é uma verdade que nunca foi totalmente construída e, portanto, ainda precisamos lutar criticamente por ela.”
Interessante notar que a construção de um conceito amplo e completo de direitos humanos é algo que lesaria os próprios interesses da esquerda. Afinal, este conceito certamente provocaria a compreensão, por exemplo, de que a abertura das fronteiras para refugiados pode ser entendida como uma clara exposição de perigo aos direitos humanos das mulheres locais, à luz de estatísticas que apontam para o crescimento assustador do número de estupros após a adoção dessas políticas migratórias na Europa[4]. Também poderá considerar que a permissão às cirurgias de transexualização, uma das bandeiras caras da esquerda ocidental, pode ser não a concessão de um direito humano do transexual, mas ao revés, uma lesão, à vista da epidemia de suicídios que acomete aqueles que se submetem ao procedimento[5].
Tudo isso mostra que o alerta da articulista para a necessidade de a esquerda nacional aprofundar seus conhecimentos e passar a entender o outro é, na realidade, algo alvissareiro. Isso porque o conhecimento da verdade sempre será uma ameaça à narrativa progressista. Ao tomar conhecimento de literatura conservadora, muitos ex-esquerdistas converteram-se. Tudo isso mostra que a direita precisa continuar avançando. Se a esquerda entender que, para oferecer um contraponto efetivo, precisará deixar as camisas vermelhas no armário para pegar em livros, estaremos inspirando neles um sentimento que poderá, na realidade, implodir a esquerda de fora para dentro, sem ter de se valer da suja estratégia gramsciana. O conhecimento é, assim, a maior arma do conservador. E a verdade, a munição de ouro para vencer esta guerra cultural.
[1] https://www.cartacapital.com.br/politica/a-nova-direita-conservadora-nao-despreza-o-conhecimento
[2] https://www.epochtimes.com.br/direito-posse-de-arma-reduz-criminalidade-afirma-harvard/#.WeNcjmi3zIU
[3] http://www.cartaeducacao.com.br/reportagens/brasil-mantem-ultimas-colocacoes-no-pisa/
[4] http://www1.folha.uol.com.br/mundo/2017/04/1878328-alemanha-tem-aumento-de-crimes-cometidos-por-refugiados.shtml
[5] https://colunas.gospelmais.com.br/tragedia-silenciosa-epidemia-suicidios-transgeneros_11456.html